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março 25, 2013

Crítica: excelente temporada de 'Girls' mostra mais um passo à complicada vida adulta

Seriado retrata jovens adultas "modernas" que agora, ironicamente, buscam um "príncipe"


Depois de uma primeira temporada que mais serviu para a introdução da história de quatro amigas - Hannah (Lena Dunham), Marnie (Allison Williams), Jessa (Jemima Kirke) e Shoshanna (Zosia Mamet) - em uma jornada de autodescoberta na vida adulta, a série da HBO, Girls finalizou seu segundo ano no último domingo (24). Vencedora do Globo de Ouro de Série Cômica este ano, ela se despediu com irônico ato: fora do berço, a busca por um novo colo - o amor. Tudo continuou seguindo por um caminho ainda mais tumultuado do que na fase anterior (problemas em relação ao sexo, o trabalho, relacionamentos), porém, as inseguranças são as mesmas. Como ser adulta sem deixar de fazer as coisas do seu jeito? Elas tropeçam nessa questão de forma fenomenal e reflexiva.

Hannah, depois de desilusões amorosas e problemas com suas amigas, está dedicada a buscar sua independência financeira. Seu primeiro trabalho vem com a sua tão sonhada vida de escritora. A chance de escrever um e-book para uma editora relatando suas reviravoltas da vida (mais uma prova do tom autobiográfico que a série da própria Lena tem), acaba deixando-a estressada, ansiosa e desencadeia TOC (transtorno obsessivo compulsivo), algo que a jovem já havia tido na infância. Hannah ao mesmo tempo que tem o desejo de abraçar a nova fase da vida, ainda se recusa à crescer - e a doença representa isso. Em um dos episódios, ela se envolve com um homem mais velho (participação especial de Patrick Wilson), médico e recém-separado. Tem uma catarse do que pode seu futuro, mas não alimenta a ambição - afinal, aquilo não parece lhe pertencer. Esse episódio que foi massacrado por parte da imprensa (por ser de fato inverossímil, como várias outras coisas na série - mas que pra mim servem como licença poética), serviu em base para entendermos a constante frustração da protagonista. Ela não tem nada e ninguém de fato. Chora sozinha quando cai a ficha daquele momento que mais parece um sonho. Ser mulher moderna e independente é complicado e trabalhoso.

No penúltimo episódio, Hannah fere o ouvido. Seus pais não oferecem ajuda que ela tanto clamava e na enfermaria, sozinha, nem o enfermeiro lhe dá a atenção que tanto quer. Encontra o ex Adam (Adam Driver) que faz a linha "estou bem sem você". Passa-se o episódio inteiro achando que o TOC tem tomado conta dela, mas na cena final, percebe-se que esse fato isolado foi apenas uma ferramenta infantil de Hannah pra chamar atenção e fugir das responsabilidades (seu livro está atrasado).

Hannah é uma criança mimada, que de preguiça de se levantar, machuca a bunda obesa ao se arrastar. Corta o cabelo e fica mais ainda parecida com uma criança. Se auto feriu o ouvido, metaforicamente porque não quer ouvir os outros. Jogam as verdades em sua cara, e ela logo veste o papel da vítima, mente e se faz de doente. Faz pirraça. Se esconde de quem sabe do seu fingimento. Sorte sua que no fim, Adam, que tem lá seus problemas de aceitação das pessoas sobre seu comportamento íntimo pouco comum, corre atrás da amada - a única que aceita seu lado sombrio. Hannah adulta é o retrato de sua infância: faltava as aulas se dizendo doente, não quer escutar ninguém e busca atenção (faz questão de mostrar a pulseira de pronto socorro no pulso) ou um novo alguém para cuidar de si.

Marnie segue o mesmo caminho. Frustrada profissionalmente, tem seus problemas com o ex-namorado Charlie (Christopher Abbott) e sua dificuldade de se desvirtuar disso. Suas semelhanças com Hannah são muitas. Enquanto Hannah tem características que a "atrapalham" seguir sua vida (é por vezes egoísta, presunçosa, narcisista, neurótica), Marnie tem ao seu favor, sua beleza e carisma. Se envolve com um antigo chefe, e se vê como Hannah sonhando: com um homem mais velho, independente e que serve tanto para se satisfazer pessoalmente, quanto profissionalmente. Porém, Marnie se incomoda com Charlie ter seguido sua vida. Como uma criança abandonada (sendo que foi ela quem terminou com ele) corre atrás dele. Suas ações aumentam ainda mais quando ela descobre que ele está rico. Ela chora, faz escândalo, corre atrás e quando ele não quer voltar a namorar, ela faz cena. Cruza os braços, chora. Humilha Charlie que não lhe quer dar o doce. No fim, consegue.

As outras amigas tiveram tramas menores, como de praxe. Mas dessa vez, Shoshanna apareceu mais que Jessa. A mais retraída das amigas, agora tem, literalmente, gritado pelo o que quer, ao invés de seguir uma vida conformista - o terror de todas. Depois de perder sua virgindade com Ray (Alex Karpovsky) - um outro exemplo de personagem com falta de perspectiva e que é acomodado -, ela se sentiu na obrigação de o ter como namorado. Até que... como nunca na vida, Shoshanna se entrega à perdição sexual, da qual, uma grande cidade pode oferecer, e ela vai viver isso intensamente. Jessa, seguindo o estilo "carpe diem" ao pé da letra, se casou com um desconhecido e se separou num piscar de olhos - depois ainda de conhecer os pais do cara (que representam tudo que ela é contra). Ela tenta viver sua vida se entregando ao mundo, como aprendeu com seus pais - mas eles mesmos tem problemas em relação à vida e com a própria filha que constantemente é imatura.

Girls caminha seus primeiros passos, como pede o início da vida adulta, apesar de que suas protagonistas preferem ainda imaginar que podem virar cantoras, terem dinheiro brotando de árvores e que a felicidade é possível como quiserem (esbarrando em homens bem sucedidos por aí). Se escondem em falsas obrigações (o livro pra entregar), e se encontram nos garotos que igualmente tem suas frustrações e vulnerabilidades. Procuram uma acomodação sentimental e profissional achando que seguem o plano de garotas modernas e distantes do futuro aterrador que seus pais aceitaram. No fim, com essas atitudes, elas não se dão conta que caminham para o que eles inevitavelmente abraçaram: a vida adulta nada romântica e sim realista.

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