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dezembro 04, 2012

Crítica: 'As Vantagens de ser Invisível' reflete as confusões adolescentes com maestria

Adaptação de livro capta bem a essência da obra


Histórias adolescentes sempre terão seu lugar cativo na cultura global. Afinal, todos passam por essa fase que guarda momentos bonitos, mas também pesadelos infernais. É nessa fase, que o jovem vai aos poucos percebendo que a infância está indo embora, sem chances de voltar e um turbilhão de sentimentos e emoções vão tomando conta. Como bem mostrou o brasileiro À Deriva (2009) ou no clássico Juventude Transviada (1955), nessa fase, a sensação é que sempre se está à beira de um precipício. Em As Vantagens de Ser Invisível (2012), adaptação da obra de Stephen Chbosky (dirigida por ele mesmo), incorpora todos os tormentos juvenis nos anos 90 - uma década apática, mas nem por isso calma.

A história narra as desventuras do acanhado Charlie (Logan Lerman), que acaba de adentrar o selvagem Ensino Médio - da mesma forma mostrada em Meninas Malvadas (2003), só que sem grande humor. Inteligente, Charlie tem um grande problema de interação e aceita apenas ser observador do que acontece ao redor. Indagado pelo seu professor de literatura à participar mais, ele resolve mudar de atitude. Então, cansado da solidão, ele acaba cedendo e dando espaço para uma repentina amizade com o homossexual Patrick (Ezra Miller) e a bela Sam (Emma Watson).

A história segue um arco cheio de pequenos acontecimentos que se aproximam de uma realidade. Fazendo uma dura crítica ao bullying, mostra o problema em diversas vertentes e que, apesar de sempre existir, programas escolares incitam um sistema injusto e preconceituoso entre populares e nerds. A primeira paixão do protagonista é retratada, assim como os problemas pessoais dos amigos: o caso amoroso de Patrick com um popular jogador de futebol da escola e como Sam leva sua relação com o mais novo amigo. Nas estrelinhas, para complicar o processo de assimilação de Charlie com a vida, ele ainda está superando um doloroso episódio: o suicídio do melhor amigo e a morte de sua tia Helen, da qual, guarda lembranças e traumas.

O longa é bem conduzido e pouco deve ao livro. Captura a essência da história, confundindo quando se é para confundir e faz milagres ao retirar do livro os melhores trechos das cartas, da qual, é inteiramente feita a obra. Por outro lado, acaba excluindo a família do rapaz que tem pouco tempo na tela. Infelizmente, não é mostrado o aprofundamento de sua relação com o pai (que esconde qualquer tipo de afeição alheia), com a passiva mãe e com os irmãos: o mais velho é um jogador popular e a base de orgulho da família; enquanto a irmã vai criando uma relação de confiança com Charlie, após ele tê-la apoiado contra o violento namorado (tinha mais história à contar...) e num aborto. É visível também um exagero de fazer uma trama leve, sem palavrões e excluindo o hábito de Charlie fumar. Também ficou de fora comentários sexuais que ele descreve nas cartas como, por exemplo, ele afirma que, em uma festa, um casal chegou ter relação sexual na mesma cama que ele, achando que ele estava dormindo.

Mesmo que não tão relevante, outros já seriam mais interessantes se introduzidos: o filme acabou deixando de lado a importância de seu professor de literatura para a construção de ideais - mesmo que no livro não se aprofunde sobre a opinião de Charlie sobre as obras recomendadas por ele. Também ignorou o fato de que Charlie tinha acompanhamento psiquiátrico desde a morte do amigo  e quando começou ter alucinações (é mostrado apenas ele ingerindo um comprimido no inicio do filme) - afinal, é com essas terapias que o jovem acaba se lembrando do abuso cometido pela tia, fazendo-o carregar essa culpa pela morte dela de forma instigante.

Apesar de se passar nos anos 90, As Vantagens de ser Invisível, faz muito sentido nos dias de hoje. Mesmo com muitos problemas, alguns jovens que necessitam de acompanhamento profissional, é comum vê-los desabafando em blogs e redes sociais, muitas vezes sem qualquer retorno. É complicado saber se essas cartas da história tiveram um receptor, mas na história, elas não tiveram respostas. O tanto de dor e mágoa que um jovem como Charlie carrega, só poderia mesmo levá-lo ao limite. O filme nacional, As Melhores Coisas do Mundo (2010), se aventurou em mostrar essa face de sofrimento sem resposta alheia e que assim leva ao suicídio, assim como ocorreu com o amigo de Charlie. A sua escolha em se manter calado diante todos os problemas, só poderiam levar ao extremo, aqui mostrado com alucinações e desgaste emocional.

Sensível, bem atuado - o trio de protagonistas é fantástico e denota uma boa geração de atores que se tem construído, principalmente Logan -, As Vantagens de ser Invisível é uma obra nostálgica, relembrando os bons tempos de fitas para mixagem, roupas absurdas, homenagens aos ícones anteriores. Seja nas músicas ou em encenações de The Rocky Horror Picture Show (1975) e, principalmente, como a amizade soava mais honesta e forte. Os amores mais divertidos, porém, os dramas sempre foram os mesmos, até hoje - e ainda há muita história para contar.

Trailer:

 


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