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julho 04, 2013

Crítica: 'Guerra Mundial Z' apresenta zumbis da geração 'fast food'

Uma boa mistura de gêneros que acaba caindo no lugar comum


"A Mãe Natureza é um Serial Killer". Essa é uma das frases que bem definem a alma de Guerra Mundial Z (EUA, 2013). No cinema Hollywoodiano é bem comum tramas mirabolantes sobre a sociedade com provações quase bíblicas que geram questões de moral e ética ao redor. Seja a trama com invasão alienígena, ataques terroristas, cataclismos, queda de meteoros e por aí vai. Tais eventos ganharam uma proporção astronômica com a onda apocalíptica que inundou a cultura depois de tantos conflitos sociais, crise econômica, epidemias e o medo generalizado do fim do mundo que não aconteceu (ainda). Com a recente redescoberta da ameaça zumbi com os quadrinhos que deram origem a famosa série The Walking Dead, chegou a hora deles se tornarem uma ameaça global, só que dessa vez com uma bateria mais potente. Uma pena porém, que a nova empreitada passe longe do que é a premissa do livro de Max Brooks, da qual, Guerra Mundial Z é baseada.

O longa é dirigido por Marc Forster, que tem em seu currículo, desde o filme voltado para a ação como 007 - Quantum of Salace (2008) até filmes mais dramáticos como Em Busca da Terra do Nunca (2004) e o sensacional A Última Ceia (2001). Guerra Mundial Z, apesar da premissa com ação desenfreada como propunha o marketing, acaba mostrando algo mais emocional do que o esperado. O filme narra a história sob a ótica de uma família e sua sobrevivência após o surgimento de uma misteriosa doença que desencadeia uma epidemia mundial. As pessoas infectadas, dentro de dez segundos se transformam em seres violentos e que ganham uma força e agilidade magistral atacando quem estiver no caminho. Para conter o avanço, o governo americano recruta um ex-investigador da ONU, Gerry Lane (Brad Pitt), afim de investigar a origem da doença ou alguma forma de enfrentá-la. Ele consegue escapar de um eminente contágio em massa quando estava com a esposa Karen (Mireille Enos, ótima atriz de The Killing) e suas duas filhas. Gerry então dá uma verdadeira volta ao mundo, Coréia do Sul, Israel e País de Gales atrás da respostas.

Mesmo contendo alguma ação, é possível perceber no filme várias tentativas de unir gêneros e até mesmo misturar um pouco o que já foi visto. Guerra Mundial Z tem toques de suspense e drama, o que não o faz, essencialmente, um filme de zumbis como Extermínio (2002) ou A Epidemia (2010). O modelo escolhido talvez se deva a tentativa de fazê-lo um filme da lucrativa temporada de férias, que como é praxe precisa abranger seu potencial com o grande público. Daí também vem a explicação da ausência de violência - uma cena de mutilação é apenas insinuada, assim como as mordidas. Por outro lado, é possível se divertir em larga escala com cenas aéreas que bem lembram filmes de desastres climáticos como O Dia Depois de Amanhã (2004) - que no lugar de água, é um tsunami de zumbis -, o terceiro ato lembra Resident Evil (2002) e, também, dadas as circunstâncias, o filme tem nos primeiros instantes ares bem subjetivos de um filme de guerra mais tímido, como Guerra dos Mundos (2005), além de seguir a regra do clichê da família americana desprotegida que é comum na indústria.

São quase duas horas com cenas que equilibram o drama sendo pautado por momentos de pura aventura e que segura a boa tensão do início. Mesmo tentando se aprofundar na situação mundial diante uma crise extrema - é impossível não lembrar do bom Contágio (2011) de Steven Soderbergh, quando o próprio roteiro traça paralelos de doenças como a gripe aviária ou a H1N1. Por outro lado, a característica de superprodução o deixa sem aprofundamento mais humano nas questões tratadas. Ali está o herói imune ao medo, que se sacrifica e salva vida como uma espécie de Jesus - sem qualquer traço de desequilíbrio. O mesmo herói que, simbolicamente é um oficial da ONU, o que em tempos de governos desacreditados - é citado que o presidente americano morreu -, deixa claro que aquela visão do homem mais poderoso do mundo sempre representado como a figura patriota ou que pelo menos tinha compaixão pela situação, nem sequer existe mais, passando a esperança para as mãos de uma organização (ainda) com alguma credibilidade.

Falar dos aspectos técnicos é redundante em termos de Hollywood. Mesmo ficando cada vez mais repetitivo - a moda agora são as trombetas que fizeram sucesso na trilha sonora de A Origem (2010) - o filme tem bons efeitos especiais, desde cenas no meio de grandes cidades, até uma queda de avião diante um ataque dos zumbis, assim como boa fotografia (muitas sombras quando necessário para suspense) e etc. Essa grandiloquência, porém, ainda deixa à desejar quando é alternada em contextos menores. Por exemplo, quando acontecem ataques de massa no meio de ruas, os zumbis praticamente voam e até sobem em cima um dos outros para pularem muros, porém, em ambientes fechados, como na cena do laboratório da OMS, eles correm como qualquer ator travestido de zumbi correria (a explicação talvez esteja nas refilmagens que mudaram o terceiro ato). As atuações são como qualquer uma de filme blockbuster, assim como o estereótipo de hierarquias estabelecidas. Por outro lado, é muito bom ver os grandes estúdios procurando locações diferentes do quintal de casa ou da Europa. As cenas em Israel são um frescor para os olhos, e não parecem vindas de visões equivocadas como é constante aos olhos do Ocidente. Nada como uma bilheteria internacional para ditar o que é o certo a fazer.

Apesar de se encontrar nesse gênero de terror com zumbis, Guerra Mundial Z também denota o que são as pessoas nos dias de hoje. Se zumbis são uma grande metáfora para o consumismo desenfreado e a alienação, agora, mais rápidos, são também o reflexo de uma sociedade, da qual, a rapidez do fluxo de informação, do trabalho, da busca pelo prazer e dessa banalização do tempo em que tudo precisa ser rápido como uma rede de fast food. Pode se inserir também a questão ambiental como o lixo que não para de se acumular. É como se a industria cinematográfica precisasse se manter ágil para continuar surpreender, fazendo uma descaracterização aqui e outra ali. O grande problema, é que para ela vir com um tsunami de corpos cadavéricos na direção do público e ter uma plena satisfação dele ou ao menos mostrar algo realmente marcante, é necessário apresentar uma história um pouco mais concisa do que apenas um visual diferente (como o romance que deu origem a história, parece ir mais à fundo). Uma pena que um tema tão rico em variantes termine como a frase que finaliza ao descrever a ideia da Mãe Natureza como uma serial killer: "ela adora disfarçar suas fraquezas como forças". Hollywood maquia sua falta de ousadia em filmes de interesse comercial com seus visuais extravagantes, mas não parece entender que isso só deixa ainda mais clara sua incapacidade de lidar com o público cada vez mais exigente e seu compromisso com a arte que lhe rende lucros orbitantes.


Um comentário:

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